Home Turismo Buenos Aires: o novo e antigo se encontram no golfe nas canchas argentinas

Buenos Aires: o novo e antigo se encontram no golfe nas canchas argentinas

por Redação

O Jockey Clube de Buenos Aires era na década de 1930 um dos mais importantes clubes do mundo. Devido ao seu enorme sucesso e crescente número de associados, resolve adquirir uma área de 316 hectares em San Isidro, uma cidade próxima à capital, onde finalmente poderia expandir sua área e aumentar o número de atividades oferecidas a seus membros.

Nessa área existia um campo de golfe chamado San Isidro Golf Club que provavelmente não estava à altura dos desejos do conselho diretor, já que este decide pela criação de dois novos campos de 18 buracos. Para capitanear essa tarefa eles consultam a Associação Americana de Golfe que indica o renomado arquiteto Alister MacKenzie, um dos mais experientes arquitetos da época.

Formado em medicina pela faculdade de Cambridge, o dr. Alister MacKenzie inicia sua carreira de arquiteto de campos de golfe em seu clube natal Leeds Golf Club logo após sua participação na guerra dos Boêres no início do século 20 onde serviu como cirurgião na Quarta Infantaria do Exército inglês. Entretanto sua transição de cirurgião para arquiteto de golfe só se completa na volta de sua participação na Primeira Guerra Mundial onde se associa com Harry Colt, um dos maiores arquitetos de golfe da época e que participou do projeto do famoso Pine Valley Golf Club.

Após quatro anos de sociedade resolve iniciar carreira solo e começa uma peregrinação pelo mundo construindo campos de golfe. Chega à Argentina em janeiro de 1930 tendo passado antes pela Escócia, Estados Unidos, Nova Zelândia, Austrália e México. Nesta época já tinha assinado o desenho de alguns dos melhores campos do mundo como Royal Melbourne Golf Club, Pasatiempo Golf Club e Cypress Point.

MacKenzie fica na Argentina por três meses, onde projeta oito campos, sendo cinco na Argentina e três no Uruguay, entre eles os dois campos do Jockey Clube, o Mar del Plata Golf Club e o Club de Golf del Uruguay. Estes três desenhos são até hoje referência de excelência em golfe.

Entretanto o seu mais importante trabalho veio três anos depois, onde em parceria com Bob Jones constrói o famoso Augusta National até hoje sede do Masters Tournament. Notem que já falamos do Pine Valley, do Cypress Point que juntos com o Augusta National se revezam entre os melhores campos do mundo, então das pranchetas de MacKenzie e seu ex-sócio Colt foram criados os melhores campos da história o que naturalmente os coloca no Olímpo dos arquitetos de golfe.

Infelizmente, o Augusta National foi seu último trabalho, pois MacKenzie vem a falecer em janeiro de 1934, vítima de um ataque cardíaco apenas há dois meses do primeiro Masters que na época se chamava Augusta National Invitational Tournament.

É importante também mencionar que para ajudar na construção do Joquey Clube veio com ele um jovem engenheiro chamado Luther Koontz que fica para executar a construção dos campos, se apaixona pela região, e acaba se radicando na Argentina tornando-se o arquiteto de golfe mais importante do Cone Sul, onde constrói mais de 20 campos entre eles Olivos, San Isidro, Llao Llao, Cantegril em Punta del Este e o São Fernando no Brasil.

Parte do sucesso da metodologia de MacKenzie pode ser entendida através da leitura dos seus 13 princípios para um campo de golfe, onde destacamos cinco deles:

– Os greens e fairways devem ser bastante ondulados, mas não deve haver nenhuma montanha para ser subida.
– Todo buraco deve ter um caráter diferente.
– Deve-se ter completa ausência de irritação e trabalho causados pela necessidade de encontrar a bola.
– O campo tem que ser concebido para que até o handicap alto ou iniciante tenha a possibilidade de se divertir, apesar do fato de estar fazendo um score muito alto.
– Deve-se ter um número mínimo de tiros cegos para o green.

O Jockey Clube de Buenos Aires é o único clube no mundo a ter o privilégio de contar com dois campos desenhados por MacKenzie, porém mais impressionante é a forma com que este campo foi conservado, o que evidencia a importância de nosso esporte na cultura Argentina.

Jogar nesse campo é, além de uma viagem no tempo, uma aula de arquitetura, onde as opções de jogo são sempre muito grandes, desde o traçado escolhido até o tipo de tacada possível. Por serem muito ondulados e angulares, os greens são particularmente interessantes e precisam ser bastante estudados pelos jogadores que pretendem fazer uma boa pontuação.

A cancha colorada é mais aberta e franca, enquanto a celeste, especialmente o segundo terço, é mais estreita e curta, mas com tiros que exigem maior precisão. De certa forma, os dois campos se completam utilizando o mesmo princípio arquitetônico o que é uma prova da qualidade do projeto.

Entre seus buracos mais memoráveis temos que mencionar o número dez da cancha colorada ou o “buraco sem pares”. Trata-se de um curto par cinco em dog leg à direita onde um driver na raia vai permitir chegar ao green com a segunda. O interessante é que esse green está em diagonal para a direita e divide-se em três partes, a primeira e maior, uma longa rampa que conduz a única parte plana do green, um platô não muito grande situado a dois metros acima do início do green, e a terceira parte é uma rampa ainda mais íngreme que a primeira o que torna o approach ainda mais desafiador. De certa forma, este desenho resume um dos conceitos mais usados pelo arquiteto e muito presente no Augusta National, onde o uso de platôs e a inclinação premiam apenas os tiros muito precisos.

O club house foi construído em 1940, ou seja, dez anos após o campo, e, como pode ser visto em todos os lados, é uma presença marcante na paisagem, embelezando ainda mais um terreno talvez um pouco plano para um campo de golfe, mas que com suas diversas valas e greens movimentados não é jogado desta forma. Quando se entra no club house, os retratos nas paredes evidenciam a importância desse clube através das fotos dos grandes que uma vez pisaram por aqui. Para nós brasileiros fica a alegria de ver Mario Gonzales na companhia de De Vicenzo, Henry Cotton, Bobby Jones e Severiano Balesteros.

Buenos Aires Golf Clube: em 2000, foi sede da Copa do Mundo de Golfe em um torneio vencido por Tiger Woods em parceria com David Duval


Buenos Aires Golf Clube
Saltamos quase um século e chegamos a 1987, quando um grupo de empresários, entre eles o pai do atual presidente Argentino, Mauricio Macri, resolve construir um campo de golfe moderno de nível internacional.

Para isso contratam o arquiteto americano Von Hagge, com 240 campos construídos pelo mundo, entre eles o Crandon Golf, em Key Biscayne, e o Le Golf National, em Paris, sede da Ryder Cup de 2018.

Tendo começado sua carreira na Flórida, ele já era acostumado com grandes movimentos de terra, o que é especialmente necessário em terrenos muito planos como o sul da Flórida e a província de Buenos Aires. Sua ideia de campo são buracos com hazards, morros e grandes bunkers. Não se trata de uma arquitetura penal clássica, já que ele oferece aos jogadores várias formas de jogar seus buracos, mas sem dúvida a grande presença de água e suas raias estreitas oferecem desafios inúmeros até para o melhor dos jogadores.

No Buenos Aires Golf Clube ele criou três voltas de nove buracos chamadas de Amarela, Verde e Azul, sendo que a menos difícil é a Verde, seguida por Azul e Amarela. O campo ficou tão bom que em 2000 foi sede da Copa do Mundo de Golfe em um torneio vencido por Tiger Woods em parceria com David Duval.

Na ausência de muito vento o campo é bastante agradável e pode ser apreciado por todos os jogadores, mas só aqueles de handicap mais baixo vão conseguir sair daqui com a maioria das suas bolas ainda na bolsa. Se o vento estiver forte e seu handicap não for inferior a 10, tenha pelo menos uma dúzia de bolas a sua disposição, pois alguns buracos vão ser particularmente desafiadores.

Este é o caso do buraco 6 da volta Amarela, um par cinco reto de 583 jardas com água por toda a lateral direita e fora de campo por toda a lateral esquerda. Esse buraco exige do jogador não só precisão, mas também distância, então um par aqui pode e deve ser comemorado.

A volta principal é jogada na combinação verde/amarela e estas duas voltas circundam dois enormes lagos e praticamente não se avista nenhuma construção, o que torna a paisagem ainda mais bonita e agradável. Jogue neste campo com uma máquina fotográfica na mão e o cartão de pontuação fechado na bolsa para aproveitar tudo que este belo design tem a oferecer, inclusive se arrisque mais do que o normal, pois nesse campo as tacadas perfeitas serão recompensadas.


Através dos anos tenho jogado na Argentina e aprendi que até no golfe este é um país peculiar. São mais de 300 campos, sendo que 150 apenas na província de Buenos Aires, então são muitas as opções de jogo. Infelizmente o acesso aos campos é diferente do que se vê na maioria dos países onde pela internet é possível se informar sobre as regras de cada campo e até mesmo marcar um horário de saída.

Na Argentina, pelo menos nos melhores campos, isso não acontece, e, às vezes, até um e-mail educado não é respondido, por isso contratar um guia local me parece adequado. Tive a felicidade e prazer de jogar três voltas com Javier Pinto, um dos donos da agência We Golf que, além de ajudar a navegar pelas particularidades dos campos da Argentina, me ofereceu a oportunidade de conhecer melhor a própria cultura de golfe desse país que é fruto de sua forte aliança comercial com a Inglaterra entre meados do século 19 e início do 20, tendo desenvolvido bastante os esportes bretões como golfe, rúgbi e futebol.

Parece que agora o golfe argentino começa a se abrir um pouco mais, então recomendo a todos apaixonados pelo esporte visitar nossos amigos argentinos e desfrutar de um golfe de qualidade, onde campos não vão faltar e é uma experiência interessante ver o esporte pelos olhos desse povo tão apaixonante.

 

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